top of page
  • Foto do escritorpriscilademoraesps

Depressão na Atualidade: Uma Perspectiva Psicanalítica


Na contemporaneidade, a depressão é um fenômeno cada vez mais prevalente, afetando milhões de pessoas em todo o mundo. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2022, mais de 300 milhões de indivíduos sofrem de depressão, tornando-a uma das principais causas de incapacidade. No entanto, além dos fatores biológicos e psicológicos, é imprescindível considerar os aspectos sociais e culturais que potencializam essa crise.


O mundo contemporâneo é marcado por uma solidão crescente, alimentada pela desconexão humana em um cenário dominado pelo individualismo e pela fragmentação das relações sociais. Além disso, as rotinas exaustivas de trabalho, impulsionadas pelo ritmo frenético da sociedade contemporânea, contribuem para o aumento dos casos de depressão. A pressão por desempenho e produtividade, aliada à precarização do trabalho e à insegurança econômica, cria um ambiente propício para o surgimento de sintomas depressivos.


Outro fator relevante é a imposição de grandes expectativas sociais e individuais, alimentadas pela cultura do sucesso e da felicidade instantânea. As redes sociais, por exemplo, funcionam como vitrines de vidas idealizadas, gerando comparações constantes e sentimentos de inadequação. A busca incessante por padrões inatingíveis de perfeição contribui para o aumento da ansiedade e da depressão, à medida que os indivíduos se veem incapazes de corresponder às expectativas impostas.


Na atualidade, a tendência à medicalização da vida revela uma preocupante inclinação em atribuir uma explicação e solução exclusivamente biológica e medicamentosa aos sofrimentos humanos. Embora a medicação e a psiquiatria desempenhem papéis cruciais em casos que realmente necessitam, é essencial questionar a rapidez com que diagnósticos são feitos em situações que poderiam ser compreendidas de forma mais abrangente. Esta tendência muitas vezes resulta na exclusão do sujeito dentro de parâmetros psiquiátricos e do DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), negligenciando a complexidade e singularidade de cada indivíduo.


Embora pareça atual, a depressão é tão antiga quanto a humanidade. Desde os mitos de origem até as concepções de Hipócrates sobre a teoria dos humores, a história registra exemplos de compreensão e tentativas de lidar com essa condição ao longo dos tempos.


Sob a ótica da psicanálise, podemos compreender esse mal-estar como resultado de conflitos intrapsíquicos e da complexidade das relações sociais. No presente texto, explora-se brevemente a visão psicanalítica da depressão, inspirada em pensadores como Sigmund Freud e contemporâneos, como Maria Rita Kehl, e discute-se a importância da análise e da expressão verbal no tratamento desse transtorno.


Freud, em sua obra "O Mal-Estar na Civilização", descreveu como a sociedade moderna impõe ao indivíduo demandas e restrições que muitas vezes entram em conflito com seus desejos instintivos. Essa tensão entre o princípio do prazer e o princípio da realidade pode resultar em sintomas depressivos, manifestando-se como um sentimento de vazio e desamparo diante das exigências do mundo exterior.


Maria Rita Kehl, em "O Tempo e o Cão", amplia essa reflexão ao abordar a temporalidade na experiência da depressão. Ela argumenta que a depressão pode ser entendida como uma tentativa de congelar o tempo, uma recusa em lidar com as transformações e os desafios da vida. Nesse sentido, o indivíduo deprimido busca refúgio em um estado de letargia, resistindo à passagem do tempo e à inevitabilidade das mudanças.


Diante desse cenário, a psicanálise se apresenta como uma ferramenta importante no tratamento da depressão. Através da análise, o sujeito é convidado a explorar sua história atual e pregressa, desvelando os conflitos e traumas que alimentam seus sintomas depressivos.


Além disso, a fala desempenha um papel fundamental no processo de cura. Ao dar voz às suas angústias e experiências, o sujeito é capaz de reconstruir seu sentido de identidade e autonomia, rompendo com o silêncio opressivo da depressão. Em um processo de análise, o sujeito encontra novas formas de se relacionar consigo mesmo e com o mundo, ampliando suas possibilidades de agir e sentir.


Por fim, a abordagem psicanalítica da depressão nos convida a olhar para além dos sintomas superficiais, buscando compreender as raízes inconscientes desse sofrimento. Por meio da análise e da fala, é possível abrir caminho para a transformação, resgatando o sujeito deprimido de seu estado de alienação e desamparo. A psicoterapia auxilia o sujeito na interrogação sobre o sentido particular de sua existência e das causas de seu sofrimento, abrindo espaço para que a singularidade de cada um possa (re)existir.

bottom of page